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terça-feira, 18 de março de 2003

Ecos troainos

Ao longo de oito anos, o ex-presidente FHC manteve o hábito de não responder às críticas, preferindo desqualificar os críticos – e um de seus adjetivos favoritos para eles era “Cassandras”, profetiza troiana que só previa desgraças. O que FHC omitia (e a imprensa, por ignorância ou complacência, não lembrava) é que a filha do Rei Príamo não errava uma.

Se não me falha a memória, Cassandra ganhou de Apolo o dom da profecia, mas Atena (temendo que essa capacidade fosse usada contra os gregos) acrescentou duas ressalvas: ela só seria capaz de prever desgraças e ninguém acreditaria nela. A segunda é quase uma redundância – ninguém quer acreditar nas previsões ruins, com ou sem incentivo divino.

Lembrei-me disso ao ler um excelente artigo de Nicholas Kristof no “New York Times” (requer registro gratuito). Kristof, que está na Turquia, lembra a guerra narrada na Ilíada para mostrar paralelos entre aquele conflito e o iminente ataque americano ao Iraque.

O engraçado é, na ótica de Kristof, os americanos estão cometendo os erros tanto de gregos (desdém por aliados e pouco planejamento de longo prazo) quanto de troianos (ignorando as opiniões da Cassandras que não engolem o cenário cor-de-rosa que Bush pinta).

Mas é claro que há um ponto escamoteado, afinal o autor é americano. Acreditar que os EUA estão atacando para libertar o Iraque e não para controlar sua produção de petróleo é como engolir que os gregos destruíram Tróia para resgatar Helena, não para controlar as riquíssimas rotas comerciais do Helesponto.

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